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NSX – o regresso da lenda

Texto: Ricardo Machado / Fotografia: Vasco Estrelado
Data: 7 de Abril, 2017

Quatro motores e uma potência de 581 CV. O novo Honda NSX aposta na tecnologia híbrida para honrar o nome daquele que é um dos mais recordados superdesportivos de sempre. Conseguirá? Foi o que procurámos perceber num confronto com o BMWi8.

O Honda NSX não tem um, nem dois, nem três, mas sim quatro motores.Atrás do condutor, em posição central traseira um V6 de 3.5 litros e 507 CV é a alma do NSX. Entre este e a caixa de dupla embraiagem de nove velocidades encontra-se um motor elétrico de transmissão direta com 48 CV. Para além de assegurar a rapidez da resposta enquanto os turbos do motor térmico ganham rotação, carrega as baterias que permitem realizar pequenas deslocações no modo zero emissões. Mais à frente, a unidade de duplo motor elétrico (TMU) gere o binário aplicado às rodas dianteiras. Como? Utilizando dois motores elétricos de 37 CV e funcionamento independente para travar ou acelerar cada uma das rodas. É a vetorização de binário levada ao extremo, em combinação com a tração integral e a travagem regenerativa.

No total, são 581 CV e 646 Nm de binário que, geridos pelo sistema Sport Hybrid SH-AWD, permitem ao Honda NSX anunciar 307 km/h de velocidade máxima ou 3,1 segundos no arranque até aos 100 km/h. Valores que, juntamente com o preço e o sistema de tração integral, colocam o superdesportivo japonês no mesmo patamar de performance do Audi R8 e do Porsche 911 Turbo. O NSX tem, porém, a particularidade de recorrer à tecnologia híbrida, tal como o Ferrari La Ferrari ou o McLaren P1 ou o Porsche 918. Mas estes já “gravitam” na órbitra dos 900 CV… e já para lá do milhão de euros, cinco vezes mais do que o valor anunciado para o Honda.

Com um motor 1.5 turbo de três cilindros e 231 CV em posição central traseira e um motor elétrico de 131 CV no eixo dianteiro, o BMW i8 é o concorrente tecnológico mais próximo do Honda NSX. Contudo, apesar de ser super na imagem, os 362 CV de potência combinada fazem com que o desempenho seja “apenas” desportivo face ao poderio dos 581 CV do híbrido japonês.

 

Carbono e alumínio

Mesmo sem igualar o arsenal tecnológico do Honda NSX, o BMW i8 continua a ser um desportivo à frente do seu tempo. Desenvolvido com base na arquitetura LifeDrive, combina uma célula de habitáculo construída em plástico reforçado com fibra de carbono (Life), com um chassis em alumínio (Drive), ao qual está a associada a suspensão, McPherson à frente e multibraço atrás, bem como os sistemas de propulsão elétrica e térmica. Estruturalmente idêntica às de aço, mas mais leve devido à substituição do metal pelo carbono, esta arquitetura permite fixar o peso nos 1485 kg. Valor surpreendente para um carro com uma bateria de iões de lítio com 7,1 kWh de capacidade, um motor elétrico com 131 CV, um motor 1.5 de três cilindros a gasolina e toda a parafernália eletrónica necessária para controlar o veículo.

Na Honda, a construção “space frame” também combina diversos materiais, na maioria alumínio e aços de elevada e ultra elevada resistência. O carbono está reservado para o tejadilho e para o piso à frente dos lugares dianteiros. É pouco e ajuda a perceber por onde andam os 1776 kg de NSX. Por muito alumínio que se use, não há milagres quando se juntam três motores elétricos a um bloco térmico, sem contar com as baterias e os controladores…

O que o Honda perde no peso ganha em rigidez dinâmica à torção. Montando os diversos componentes numa fundição rígida, suportada por um membro em alumínio extrudido, o NSX garante uma rigidez local ultraelevada ao mesmo tempo que mantém sempre a geometria ótima do chassis. Naquela que é a estreia na indústria automóvel da tecnologia de fundição por ablação, os nódulos de alumínio da estrutura servem de pontos de montagem ultrarrígidos para a suspensão, eliminando os sub-chassis tradicionais.

Enquanto as rótulas duplas dos triângulos sobrepostos da suspensão dianteira eliminam a ação do binário na direção, a rigidez lateral do eixo traseiro multibraço minimiza os movimentos da carroçaria provocados pela aceleração. Amortecedores ativos com fluido magnetizado, direção com assistência elétrica e travões Brembo completam as ligações ao solo de um superdesportivo que, apesar de centrar as massas em torno do condutor, desloca 58% do peso sobre o eixo traseiro.

 

Voar sem asas

Provando que os superdesportivos não se medem pelo tamanho das respetivas asas e ailerons, BMW i8 e Honda NSX dispensam estes inestéticos adereços. Linhas fluidas, quase orgânicas, conduzem o ar em torno das carroçarias, reduzindo os distúrbios aerodinâmicos ao mínimo indispensável. Mais evidente no i8 do que no NSX, o canal esculpido entre o ombro e o prolongamento lateral, como uma aba, do pilar C é o principal responsável pela ausência de apêndices.

Eliminando os distúrbios aerodinâmicos, anulam-se as fontes externas de ruído. Em autoestrada pouco mais se ouve para além do barulho de rolamento. No i8 é natural. A bateria tem autonomia para 35 km de condução em modo elétrico, distância que diminui drasticamente quando se exploram os 120 km/h de velocidade máxima. No NSX é o modo Quiet em ação. Fecham-se as válvulas do escape e a gestão eletrónica Sport Hybrid SH-AWD antecipa as passagens de caixa para as 4000 rpm. A direção fica ligeiramente mais leve, em sintonia com o pisar descontraído dos amortecedores magnéticos.

Apesar de surpreender pelo conforto em todos os tipos de condução, esta não é a caraterística que se procura num superdesportivo. Quer-se velocidade e interação com o carro. Para tal, basta rodar para a direita o comando localizado por baixo do ecrã tátil de 7’’, que centraliza o entretenimento e a integração com smartphones. Funcional e minimalista, como o desenho de todo o habitáculo. A orientação para a condução desportiva vê-se na escassez de locais de arrumação, na falta de espelhos de cortesia nas palas para o sol, nas aplicações em Alcantara nos bancos ou no volante cortado em cima e em baixo. Um desenho que, juntamente com os pilares A estreitos, mais uma estreia mundial com assinatura Honda, maximiza a visibilidade. O enquadramento com o condutor e o ecrã TFT a cores de 8’’ que faz as vezes de painel de instrumentos.

 

Sempre a fundo

O primeiro contacto com o Honda NSX foi na pista do Estoril e não foi por o volante estar à direita que tivemos de recalcular trajetórias e pontos de travagem. Foi porque a dinâmica da condução é fenomenal! A primeira volta, em modo Quiet foi tranquila. A segunda, em Sport, abriu as válvulas de admissão e escape, enchendo o habitáculo com a alma do V6, e atrasou o limite das passagens de caixa para as 7500 rpm. A condução começou a animar, mas ainda sem grande espetacularidade. A Honda definiu este como o modo de condução geral, mantendo as definições de direção e amortecimento do Quiet.

Novo movimento para a direita do comando Sistema Dinâmico Integrado (IDS) e ativa-se o modo Sport+. A caixa de nove velocidades otimiza o tempo entre passagens para responder ao mapeamento mais agressivo do acelerador, enquanto os motores elétricos passam a disponibilizar o binário máximo para tornar as acelerações mais explosivas. A vetorização de binário torna-se mais notória, tal como a reatividade da direção, a firmeza do amortecimento e a sonoridade do escape. Foi a partir daqui que tivemos de reaprender as trajetórias.

Com os dois motores elétricos dianteiros a assegurar a vetorização de binário e o autoblocante traseiro a evitar que este se escoe pela roda interior, o NSX parece girar sobre um pivot central. É possível acelerar muito mais cedo e atrasar a travagem para lá do razoável – o instrutor que seguia ao nosso lado sugeriu começar a desenhar a curva 3 com o pé no travão, mantendo-o lá até perto do apex – sem reações inesperadas. Nem os pneus 245/35 ZR19 à frente e 305/30 ZR20 atrás se queixam. Tão rápida no modo manual como no automático, a caixa de dupla embraiagem não consente quebras de regime. Mesmo que estas aconteçam, não são dramáticas porque o motor elétrico compensa o tempo que o turbo demora a ganhar pressão.

Quatro segundos na posição mais à direita confirmam a ativação do modo Track. Da travagem ao acelerador, passando pelo escape, que acrescenta 25 dB ao som do modo Quiet, toda a gestão do IDS assume uma programação mais agressiva. É aqui que se pode desligar o controlo de estabilidade e acionar o controlo de partida. Basta travar com o pé esquerdo e acelerar a fundo até acender o indicador de ativação do sistema. Depois é só tirar o pé do travão. Como um atleta a largar dos blocos de partida para os 100 metros, a frente levanta, por ação do TMU, e o NSX dispara como um todo. Um processo tão fluido e eficaz que faz o Porsche 911 Turbo parecer abrutalhado.

 

Sabe a pouco

Depois das emoções fortes da pista, o trajeto de estrada veio confirmar a qualidade e o conforto do Honda NSX. O acesso não é brilhante, requerendo, como acontece com o BMW i8, habituação. Em estrada, o i8 revela-se um desportivo convincente, mesmo quando, como foi o caso, as baterias estão descarregadas e conta apenas com os 231 CV do motor térmico. Houvesse uma tomada à mão e três horas para carregar totalmente a bateria e teríamos desfrutado em pleno dos 362 CV. Sem a ajuda do motor elétrico, a falta de força do bloco de três cilindros abaixo das 3000 rpm é gritante, obrigando a uma gestão delicada da caixa.

Controlada pelo Sport Hybrid SH-AWD, a carga das baterias do NSX garante uma resposta pronta em qualquer situação. Mais comunicativa, a direção do Honda transmite uma sensação de unidade. O NSX move-se sempre como um bloco, enquanto, no limite, os eixos do BMW i8 parecem trabalhar cada um para seu lado. Independentemente do modo de condução, o Honda é sempre mais confortável. Exemplar na forma como filtra as irregularidades sem comprometer a interatividade, o amortecimento magnético é um dos principais trunfos desta segunda geração do Honda NSX. O outro é a motorização híbrida. São os três motores elétricos, mais o V6 a gasolina que colocam o Honda NSX entre os superdesportivos mais exclusivos do mundo.